Se você depende do aluguel comercial nesse período que estamos lutando contra o coronavírus (COVID-19), seja como locador ou locatário, certamente anda cheio de preocupações. Ao longo desses últimos dias, para conter a disseminação do vírus, governos têm adotado medidas nunca antes implementadas, como o isolamento social, fechar escolas, fronteiras e suspender as atividades empresariais tidas como não essenciais.
De um lado temos a questão da saúde, de outro, a questão da economia. Quanto à saúde, é praticamente unânime a opinião de que adotar a postura de isolamento é a melhor medida, no entanto, quando se trata da conjuntura desses dois aspectos, saúde e economia, a questão se torna bastante complexa e deve ser analisada de forma técnica por especialistas de ambas as áreas.
Primeiramente cumpre esclarecer que não se pretende insinuar que os trabalhadores não estejam vivenciando um momento tenso e delicado, também estão, porém, esse post visa abordar especificamente a situação das empresas. Em outro momento será abordado no blog a questão dos trabalhadores.
Todas as empresas, sem exceção – grandes, médias e pequenas-, estão vivendo momentos angustiantes. Muito embora o momento cause preocupação em todos os empresários, os menores acabam sofrendo de uma forma mais intensa as consequências dessa crise.
Os pequenos negócios empresariais são formados pelas micro e pequenas empresas (MPE) e pelos microempreendedores individuais (MEI). Segundo o Sebrae, 99,1% dos 12 milhões de estabelecimentos existentes no Brasil são compostos por pequenos negócios, os quais respondem por 52,2% dos empregos gerados pelas empresas no Brasil. Ressalta-se que, nos primeiros cinco meses de 2019, os pequenos negócios foram responsáveis por criar 326,6 mil novos empregos, 35 vezes mais do que os empregos gerados pelas médias e grandes companhias do nosso país¹.
Obviamente, quanto maior a empresa, maiores são as suas receitas e, consequentemente, melhores as chances de sobreviver diante de uma crise. Em contrapartida, os pequenos negócios não têm caixa suficiente para aguentar a retração do mercado por muito tempo. Deste modo, buscando ajustar-se à nova situação, é essencial diminuir as despesas. Neste sentido, uma das despesas que precisam ser repensadas é o aluguel comercial.
O Código Civil, em seu artigo 393, prevê uma hipótese de exclusão da responsabilidade do devedor por prejuízos decorrentes de circunstâncias que se enquadrem como caso fortuito ou força maior. A dificuldade consiste em saber exatamente quais serão os episódios assim considerados, eis que a legislação não tem como prever de antemão quais são os eventos que poderão se enquadrar na disposição genérica da lei.
Diante das atuais circunstâncias e considerando que a última vez que foram adotados toques de recolher globais, como os que estão sendo adotados nos dias de hoje, foi na 2ª Guerra Mundial; ainda, que diversos países decretaram estado de emergência, parece que a crise provocada pela pandemia do coronavírus (COVID-19) se enquadra perfeitamente no conceito de “motivo de força maior”.
No contrato de aluguel celebrado provavelmente terá uma cláusula prevendo qual será a medida a ser adotada no caso da ocorrência de situação decorrente de caso fortuito ou força maior. Acaso não o tenha, deverá ser analisado o caso concreto a fim de que seja estabelecida alguma medida capaz de retomar o equilíbrio contratual que existia entre as partes à época da contratação.
Vejamos, a finalidade precípua do contrato de aluguel comercial é viabilizar a atividade empresarial instalada naquele imóvel, certo? Pois bem, uma vez que a empresa não possa funcionar por motivo de força maior, certamente pode ser entendido que houve a deterioração da coisa, eis que o imóvel não mais atende ao propósito pelo qual foi objeto de um contrato. Assim sendo, será impossível cumprir as obrigações pactuadas, podendo haver o atraso no pagamento dos aluguéis ou até mesmo seja evidenciada a impossibilidade de o locatário manter o contrato de aluguel com o locador.
Neste caso, a aplicação do disposto no artigo 567 do Código Civil se mostra adequada. Vejamos:
art. 567, CC: “Se, durante a locação, se deteriorar a coisa alugada, sem culpa do locatário, a este caberá pedir redução proporcional do aluguel, ou resolver o contrato, caso já não sirva a coisa para o fim a que se destinava”.
Deste modo, o locatário poderá pleitear a redução proporcional do aluguel ou, em últimos casos, a resolução do contrato (contrato se resolve, “termina”). Esta hipótese, a saber, poderá ser adotada acaso a situação de emergência que estamos vivenciando se perdure no tempo e, por este motivo, se torne impossível a manutenção do contrato. Entretanto, é preciso ponderar que os negócios empresariais compreendem certos riscos, os quais são inerentes à atividade desempenhada, portanto os fatos alegados deverão ser devidamente comprovados.
Além disso, a excepcionalidade da medida tomada pelo poder público, interrompendo as atividades consideradas não essenciais, atingiu a todos os contratantes, não sendo justo apenas uma das partes arcar com o prejuízo.
Destarte, locatário, é importante refletir que o momento atual é inédito e sugere que sejamos complacentes uns com os outros. Precisamos pensar que a pandemia do Coronavírus (COVID-19) atingiu a todas as pessoas, inclusive, o locador, que por vezes depende do valor do aluguel para se manter.
Como compensação aos dias em que o estabelecimento precisou ficar fechado é possível pedir a redução proporcional no valor do encargo mensal; uma carência para efetuar o pagamento daqui alguns meses ou até mesmo a revisão do valor do aluguel. Desta forma, o locatário consegue um prazo ou a diminuição do valor do encargo e o locador, por sua vez, mantém a relação contratual. Ou seja, ninguém perde, todos ganham. Logo, a melhor alternativa diante do atual cenário é buscar o diálogo e a cooperação para com a outra parte, no intuito de estabelecer uma relação ganha-ganha que seja benéfica para ambos.
Mas lembre-se: para se resguardar é imprescindível que o acordo seja realizado por escrito, podendo ser feito um aditivo contratual. Porém, se não for possível encontrar uma solução extrajudicial (amigável), é possível entrar com uma ação revisional de aluguel.
¹ VILELA, Pedro Rafael. Pequenas empresas garantem saldo positivo de empregos, mostra Sebrae. EBC – Agência Brasil, Rio de Janeiro, 01 de julho de 2019. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2019-07/pequenas-empresas-garantem-saldo-positivo-de-empregos-mostra-sebrae> Acesso em: 25 de março de 2020.
1 Comentário
Post muito útil para o período de incertezas que estamos vivenciando hoje!!